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Programa da Globo dos anos 1980, em que bandas consagradas e underground tocavam num palco nas praias do Rio, volta às telas quinta-feira (08/05/2014), no canal Viva. RIO — Alguns lembram mais, outros, menos. Afinal, lá se vão 29 anos desde que a TV Globo resolveu investir na gravação de uma série de shows num palco na Praia do Pepino, reunindo as bandas do fervilhante rock brasileiro e astros da MPB. A ideia era exibir essas performances nas tardes de domingo, dentro do programa “Mixto Quente” (com xis mesmo), que começa a ser reprisado nesta quinta-feira (08/05/2014), às 22h, no Canal Viva. Dias de muito som, descontração, asa delta, mar, gatas ainda sem silicone desfilando em seus biquínis, sol e, sim, algumas nuvens. Como a que baixou sobre Lulu Santos, já na fase em que o programa foi gravado na Praia da Macumba. — Lembro que fiquei muito assustado com a violência da plateia. Acabei interrompendo o show e dando uma colocada em uns malucos ultraviolence. E o esporro foi para o ar. Com supervisão do jornalista Nelson Motta e do diretor Roberto Talma e direção de Vitor Paranhos, o “Mixto Quente” começou a ser gravado no fim de 1985 e foi exibido ao longo de 1986. — Não me lembro de quase nada. Era uma época de grande carburação de ideias — arrisca Motta, que trabalhara com Talma no seriado “Armação Ilimitada”. - O cenário fabuloso era fundamental: São Conrado ainda meio selvagem, com as melhores bandas do rock Brasil. — Era um programa para fortalecer o pop-rock, que vinha crescendo — avança o diretor Jodele Larcher, produtor executivo do “Mixto”. — Mas a gente não tinha malandragem. Tudo era feito na garra. Não tinha banheiro químico, segurança. Foi o festival da época. Visto hoje, o “Mixto Quente” se revela um belo arquivo do rock brasileiro dos anos 1980. Tem os primeiros shows do Barão Vermelho sem Cazuza, e os primeiros de Cazuza, animadíssimo, sem o Barão. Não havia cenários, os músicos tocavam quase sempre com pouca roupa, em clima de praia. E jatos d'água esfriavam os ânimos da galera, que acorreu em massa às gravações e congestionou São Conrado, onde morava o ex-presidente João Figueiredo (o que forçou, posteriormente, uma transferência estratégica das gravações para a Macumba). Irreverência não faltou nas entrevistas feitas pela equipe da produtora Olhar Eletrônico (de Marcelo Tas e do futuro diretor de “Cidade de Deus”, Fernando Meirelles). Marcelo Nova, cantor do Camisa de Vênus, foi ao ar dizendo: “Acho que a Globo tem essa característica, me parece que ela é uma empresa que tem como norma observar o gosto médio e nunca arriscar”. Já Paulo Ricardo, ainda jovem e já homem de frente do RPM, foi apresentado a uma pedra — um mineral — e confrontado a falar de rock. “Não, assim, a gente está atrasado, agora que a gente está encarando o rock de frente”, improvisou. — “Mixto Quente” foi o programa certo, na hora certa e na locação perfeita para que a Globo passasse para todo o Brasil a efervescência que vinha acontecendo na cena pop-rock do eixo Rio-SP — conta Paulo, que no “Mixto” ainda dividiu palco com Zero e Ultraje a Rigor. Integrante do Olhar Eletrônico, o diretor Toniko Melo é o que tem mais memórias frescas do programa. — A gente chegava quando o artista entrava ou saía do palco e fazia algumas perguntas filosóficas, do tipo “o que é a vida?”. Era algo que já tínhamos testado antes, na cobertura do Festival de Águas Claras. Supla, então com 18 anos e vocalista do Tokyo, foi um dos que passaram alguns maus bocados no “Mixto” mas se divertiram a valer, preservando o surrealismo reinante. — Estava um calor dos infernos, a guitarra desafinava, e eu, lá, de terno meio David Bowie, com luvas e camisa abotoada até o colarinho — recorda-se. — Parecia um macaco branco fazendo jogadas de capoeira quando cantei “Garota de Berlim”. Raul Seixas decreta a morte do rock Mas nem só dos novos nomes foi feito o rock do “Mixto Quente”. O guitarrista Robertinho de Recife apavorou o público em versão heavy com o grupo Metalmania. Sérgio Dias, guitarrista dos Mutantes, apresentou-se em carreira solo. E Raul Seixas, muito longe da sua melhor forma (e amparado pelo parceiro Paulo Coelho) decretava: “Pra mim o rock'n'roll morreu em 1959”. — Minha lembrança mais marcante é a de Raul vestido de cowboy, todo de branco, subindo a escadinha que dava acesso ao palco. Foi um momento mágico — deleita-se Paulo Ricardo. Tim Maia foi outro veterano que deixou forte impressão - pela energia que transmitiu com a Banda Vitória Régia e pela característica insubordinação. No programa, ele pode ser visto, no meio do show, dando um recado ao diretor de TV: “Ele falou pra eu cantar três e me mandar. Eu não vou embora hoje! Vou ficar até amanhã. Eu não mandei eles me colocarem aqui!” E o mix previsto pelo "Mixto" continuava nos camarins, onde conviviam novos e medalhões. — A primeira vez em que eu fumei um baseado foi ali, quando eu entrei por engano no camarim do Tim Maia. Ele foi super-receptivo e tranquilo — conta Alex Podrão, vocalista do grupo punk brasiliense Detrito Federal. — O Tim deu trabalho para a produção. Ele fez questão de passar no meio do público, de todo aquele pessoal da Rocinha, que tinha vindo para vê-lo. O Detrito foi uma das bandas convocadas pelo então jovem jornalista Tom Leão, chamado para ser uma espécie de consultor de underground do programa — ele trouxe desde os punks paulistanos do Cólera a um ainda pouco famoso Capital Inicial. Mas nada foi tão controverso quanto o vocalista do Detrito, que teria levado Roberto Talma a exclamar: “Como é que eu vou botar no ar um cara chamado Podrão?” — O “Mixto” era um programa que passava no domingo à tarde, com um monte de bandas de rock lutando no Ibope contra o Silvio Santos — analisa Tom. — Às vezes, ele perdia. Muitas vezes, empatava. E raramente ganhava. Mas saíamos felizes. Era uma vitória. Coordenadora de programação do Viva, Clarisse Goulart conta que o desejo de reprisar o “Mixto Quente” nasceu do sucesso que o revival do “Globo de Ouro” fez na grade. — Procurávamos outros conteúdos de música e achamos essa espécie de Globo de Ouro de verão. Eram os artistas com seus hits da época, de Lulu Santos à bateria da Beija-Flor. Por: Silvio Essinger(publicada no Jornal O Globo (on-line) em 07 de maio de 2014)
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